quinta-feira, 8 de julho de 2010

Pechansky diz que é preciso ajustar tratamentos

Zero Hora - Maurício Macedo

Falando para um auditório praticamente lotado, o psiquiatra Flavio Pechansky começou se desculpando. "Sei que a expectativa era de que traríamos aqui os resultados de uma pesquisa inédita sobre o crack no Brasil. Infelizmente, vou ter que frustrar todos vocês. O estudo está apenas se iniciando", disse ele, no primeiro dia de atividades no I Congresso Internacional Crack e outras Drogas, realizado ontem em Porto Alegre.
Pechansky é um dos coordenadores do trabalho que será feito em cinco regiões do País. "Vamos avaliar os programas desenvolvidos e os relatos de pacientes, familiares e técnicos. Depois também queremos tentar estimar, através de uma série de estudos, alguns resultados de intervenções que vamos testar com os usuários de crack, explica.
O trabalho que será desenvolvido pelo Centro de Pesquisa sobre Álcool e Drogas (Cpad) da Ufrgs é financiado pelo Ministério da Justiça. A previsão é de que alguns desses dados já estejam disponíveis ao final do segundo semestre. Mas, depois de coletados, eles têm que ser interpretados de uma forma compreensível para a população. Este é um trabalho mais moroso e que deve ser feito no primeiro semestre de 2011, estima o diretor do Cpad.
Mesmo assim, o especialista - que trabalha com dependência química há quase três décadas - consegue destacar pontos importantes que precisam ser levados em conta no combate ao crack. A primeira coisa importante é a compreensão de que o crack é uma droga forte, diferente das outras em termos de intensidade do impacto do uso dela."
Além disso, Pechansky avalia que o modelo usado no tratamento de dependentes de crack é o mesmo desenvolvido para outras drogas. "Em consequência disso, estamos vestindo uma camisa de tamanho errado no nosso paciente. Porque sobram coisas, falta bolso, a manga está curta. Então o ajuste dos programas de tratamento à necessidade dos pacientes é uma coisa que está na nossa mira neste momento", afirma.
A palestra de abertura do congresso ficou a cargo do ministro Gilmar Mendes. O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) destacou a necessidade de melhorias na Justiça Criminal brasileira. Quando ela não funciona adequadamente, estamos falhando na política de segurança pública." Lembrou casos de presos provisórios encarcerados de forma irregular. Um deles, no Ceará, chegou a ficar na cadeia por 14 anos.
"Buscamos revisar esses processos através do programa Mutirão Carcerário. Foram 22 mil detentos liberados depois da revisão em todo o País", ressalta.
O ministro argumenta que não devemos combater as drogas "com normas draconianas". "Dizem que nossa legislação é muito leniente. No entanto, estamos em sexto lugar no ranking mundial de encarceramento, com quase 500 mil presos", analisa. "O que a gente percebe é que as nossas ações são pouco efetivas, daí a necessidade de pensarmos em outras estratégias", propõe.
Com relação ao crack, Mendes comenta que a droga "desorienta". "Por conta dessa capacidade de fazer uma confusão entre traficante e dependente ou usuário. Ou mesmo coisas que têm aparecido na crônica dos tribunais: o fato de o sujeito praticar crimes e dizer que o faz porque tem que alimentar o vício. E são crimes dos mais variados, desde pequenos furtos até homicídios."

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