sábado, 5 de junho de 2010

É hora de união contra o flagelo das drogas

Luiz Urjais, Marcelo Fernandes, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - Problema que acompanha a Humanidade desde a Antiguidade, as drogas não fazem distinção de classe, cor, raça ou credo quando viciam alguém. O Jornal do Brasil começa uma série de reportagens expondo os riscos que o uso abusivo de substâncias entorpecentes podem trazer aos dependentes.
Segundo o médico Jorge Jáber, pós-graduado no tratamento de dependência química na Universidade de Harvard e que trabalha na Câmara Comunitária, na Barra da Tijuca (Zona Oeste), atendendo gratuitamente viciados em reabilitação, o perigo de experimentar e os danos decorrentes são maiores entre a população de baixa renda.
– Uma pessoa pobre fatalmente irá se alimentar mal, não terá uma educação de qualidade, entre outros fatores – exemplificou.
O presidente da Comissão Anti-Drogas da Câmara municipal, o vereador Tio Carlos (DEM), que, assim como Jáber, elogiou a iniciativa do JB, lamenta a falta de estrutura da saúde e diz que o governo “fala muito e faz pouco”.
– A população de rua atualmente só usa crack, uma das drogas mais fortes existentes, e também uma das mais baratas. Esse tipo de entorpecente tem um efeito instantâneo, por isso a grande procura. Nada tem sido feito pelo poder público para suprir as necessidades dessas pessoas – ressalta Carlos, que critica o atendimento dispensado aos viciados. – O sistema de saúde não tem capacidade de suprir as necessidades do estado. Acaba que as famílias precisam recorrer a ações filantrópicas para serem encaminhadas a outros municípios, on de existem clínicas de reabilitação.
De acordo com o conselheiro em dependência química do centro de reabilitação de Vila Serena, Sérgio Couto, existem três fatores básicos para uma pessoa desenvolva um vício: curiosidade de experimentar; pressão de um determinado grupo social, e pressão do grupo familiar, que, desde cedo, influencia no uso de determinada substância.
– No primeiro caso, a pessoa quer saber qual o “barato” da droga; no segundo, quer se enturmar, e a droga é um veículo para isso; no último, um dos mais característicos, a imposição de um parente, que, desde cedo, influencia no uso de álcool, porta de entrada para a dependência química – salienta Couto.
O funcionário público Claudio Barata, 52, começou cedo sua dependência de álcool. Ele conta que ainda se considera em recuperação, e que, se não fosse o amor de sua mulher e filhos, não teria encontrado o caminho para se livrar do vício.
– Sempre fui muito tímido e achava que isso era defeito. – explica Barata. – Por causa disso, comecei a beber de forma demasiada, até perceber que minha vida estava arruinada. Hoje em dia, fico feliz em ouvir da minha filha mais nova que sou exemplo de vida para ela.
Barata disse que após três meses internado, frequentou ambulatórios periodicamente e, hoje, o grupo dos alcoólicos anônimos.
– Não posso reparar o passado, mas posso construir um novo futuro. E o mínimo que posso fazer pela minha família é permanecer em recuperação, até o fim da vida.
Adolescentes sofrem mais os danos no corpo
Os menores de 18 anos formam o grupo mais vulnerável aos danos causados pelos entorpecentes. O motivo é que nesta faixa o corpo ainda está em formação.
Com isso, adultos que se drogavam na juventude têm mais possibilidades de apresentar sequelas do que aqueles que começaram mais tarde.
– Menores de 18 anos não têm órgãos como o fígado ou o cérebro amadurecidos e estes são os mais afetados pelo uso de tóxicos – explica o médico Jorge Jáber, acrescentando que usuários atrasam sua vida escolar.
– Você percebe que os usuários têm o vocabulário muito pobre. Sem estudar, o jovem repete o ano e acaba se afundando mais nas drogas – afirma.
Segundo o conselheiro em dependência química, Sergio Couto, geralmente o vício se inicia aos 9 anos.
– É preciso que haja mais campanhas anti-drogas, conscientizando sobre os malefícios dos entorpecentes.
Couto aponta a epidemia de crack como exemplo da falta de informação e põe a culpa no governo.
– Infelizmente a dependência química é uma doença recente. É necessária a formação de políticas públicas, para seu combate.
“Deixei um carro na boca de fumo e fui parar no CTI”
Comecei a beber com 12 anos. Quinze anos depois, na companhia de uma namorada, cheirei minha primeira carreira de cocaína. Era o ano 2000. De imediato, foi amor à primeira vista. A droga me deu uma grande sensação de poder e, na mesma semana, já procurava por outra dose. Inicialmente, comprava com mototaxistas que pegavam nos morros, mas, com o tempo, fui conhecendo as bocas de fumo. Comprava e me isolava em hotéis durante dois, três dias. Caso acabasse, era só ligar para o Disque-Droga. Faltava ao trabalho, não via minha família, mentia para o meu filho, dizendo que logo estaria em casa e aparecia de madrugada, drogado. Com o tempo, comecei a perceber que perdia o controle. Cheguei a deixar um carro que valia R$ 5 mil na boca de fumo como garantia de pagamento de uma dívida com os bandidos. Também empenhei minha carteira de médico apenas para comprar mais drogas. Contraí diversas dívidas, fazia empréstimos, minha vida financeira começava a desmoronar. Eram nítidos os efeitos da cocaína em meu corpo: emagreci muito, e minha sinusite atacava com força. Cheguei a ser internado na CTI, com risco de lesão cerebral e problemas nos rins. Teria que fazer hemodiálise pelo resto da vida se o quadro se agravasse. Em junho de 2008, me internei pela primeira vez, mas não fiz o pós-tratamento e acabei tendo uma recaída. Acreditava que podia ficar abstinente e depois usar só um pouco, mas sempre disparava novamente a compulsão por mais. Eu ainda tentava argumentar com a droga naquela época, e negava minha impotência em relação a ela. Entrei em outra clínica para me tratar em novembro daquele ano, e passei 105 dias internado. A intenção da droga é dar prazer a quem usa, mas o sexual vai embora. Eu não conseguia ter uma ereção sob o efeito da cocaína, e isso é uma tônica muito comum entre aqueles que usam. Estou limpo desde a segunda internação, e admiti não ter controle sobre meu vício. Tem gente que é alérgica a camarão, eu sou às drogas. Atualmente, trabalho do outro lado, atendendo dependentes químicos em uma clínica na Barra da Tijuca. Converso com meus filhos sobre meu problema, e eles entendem perfeitamente. Minha recompensa é que hoje sou de novo pai, filho e marido
Alessandro Alves Teixeira

Médico, 37 anos

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