sábado, 30 de janeiro de 2010

Estreia “É Proibido Fumar”, vencedor do Festival de Brasília

Zero Hora - Cortina de fumaça

Antes mesmo da imagem, vem o som: alguém tosse. Em seguida, vemos em primeiro plano um cinzeiro. A mulher que tosse (Glória Pires) vem até ele e pega o cigarro que ali está, enquanto fala ao celular com a irmã sobre o sofá deixado de herança por uma tia.

O que temos aí, nesses primeiros minutos de É Proibido Fumar (em cartaz a partir de hoje na Capital), em que a câmera ainda nem se moveu? Temos não só a presença do cigarro, que pontuará todo o filme de Anna Muylaert (diretora de Durval Discos), mas uma exposição sumária da protagonista e de seu entorno: uma quarentona solitária e urbana que pertence a uma classe média decaída e que fuma compulsivamente.

O primeiro mérito de É Proibido Fumar, portanto, é o de contar com a inteligência ativa do espectador, em vez de lhe entregar tudo mastigado recorrendo à irritante muleta da narração em off, tão comum em nosso cinema recente.

A história é simples: a professora particular de violão Baby (Glória Pires) conhece o músico e cantor Max (Paulo Miklos) quando este aluga o apartamento vizinho. Os dois passam a viver um relacionamento pautado por alguns pontos de atrito: o cigarro de Baby, a ex-mulher de Max, os gostos musicais (ela gosta de Chico Buarque, ele, de Jorge Ben Jor). Haverá à certa altura um acidente, um crime involuntário, uma morte. O evento será mostrado de modo fragmentário e elíptico, como tudo nesse filme que elege a metonímia como figura de linguagem predominante (num cinema assolado pelas metáforas).

Mais do que uma comédia sobre a solidão e o afeto na grande cidade, como já foi definido, É Proibido Fumar é um estudo sobre a construção da imagem, seus usos e abusos na vida contemporânea. Não por acaso, momentos importantes da ação são vistos por câmeras de vigilância, olhos mágicos, furos na parede.

O longa ganhou uma penca de prêmios no Festival de Brasília (incluindo melhor filme, ator, atriz e roteiro). Além da bela atuação do par central e do elenco secundário, merecem destaque a montagem precisa de Paulo Sacramento e a trilha sonora, que transita com humor e fluência por toda a gama da música popular brasileira.

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